A operação da
Polícia Federal desta quinta-feira (8), que mirou o ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL) e aliados, incluindo ex-ministros de seu governo, está vinculada
ao inquérito das milícias digitais, que tramita em sigilo no STF (Supremo
Tribunal Federal) sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Foi no âmbito deste inquérito que foi feito
o acordo de delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid.
Investigações neste inquérito abarcaram
desde a venda de joias presenteadas por autoridades até a suposta falsificação
de cartão de vacina.
Na operação desta quinta, a PF cumpre
mandados de busca e prisão contra ex-ministros e assessores de Bolsonaro, além
de militares envolvidos na suposta tentativa de golpe para manter o
ex-presidente no poder. Um dos alvos é o próprio ex-mandatário --ele terá que
entregar o passaporte.
INQUÉRITO DAS MILÍCIAS
O inquérito das milícias digitais foi
instaurado por Moraes em 2021, em um drible à PGR (Procuradoria-Geral da
República), que tinha solicitado o arquivamento do inquérito dos atos
antidemocráticos.
Na decisão desta quinta, Moraes afirma que a
investigação sobre a suposta organização criminosa tem cinco eixos.
Um deles é o de ataques virtuais a
opositores. Outros dois são de ataques às instituições, às urnas e ao processo
eleitoral, além de um eixo sobre os crimes de tentativa de golpe de Estado e de
abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Outra linha seriam os ataques às vacinas
contra a Covid-19 e às medidas sanitárias na pandemia. E, por fim, um eixo
sobre o suposto uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens que
possui uma série de subdivisões.
Nelas que estão as frentes sobre os cartões
de vacina e sobre as joias.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, à época do
avanço das investigações sobre as joias, a inclusão da investigação no
inquérito no STF gerou questionamentos sobre a competência da corte na apuração
por especialistas em direito penal.
Eles destacavam, porém, que devido ao
sigilo, não há conhecimento sobre quais são os eventuais elementos de conexão
entre as condutas dos alvos ou provas.
CARTÃO DE VACINA
Em maio, Moraes determinou a prisão
preventiva de Cid em decisão relacionada às suspeitas em torno da falsificação
do cartão de vacinação dele, da esposa, da filha mais nova de Bolsonaro e do
próprio ex-presidente. Ele disse em decisão haver fortes indícios dos crimes de
falsidade ideológica, uso de documento falso e inserção de dados falsos em
sistema de informações.
À época da prisão, em depoimento à PF, Cid
não respondeu às perguntas, e sua defesa alegou não ter tido acesso a todo o
conteúdo da investigação. Bolsonaro elogiou o militar e disse à PF que, se Cid
cometeu algum crime, teria sido à sua revelia.
Nesta frente, Bolsonaro já tinha sido alvo
de busca e apreensão em um de seus endereços em maio do ano passado, quando
Mauro Cid foi preso.
JOIAS
Em decisão do ano passado em que autorizou
busca e apreensão contra diferentes agentes, entre eles, o pai de Mauro Cid,
relacionada às joias presenteadas por autoridades internacionais ao
ex-presidente, Moraes cita a investigação do crime de peculato e ainda lavagem
de dinheiro.
Em agosto, Cezar Bitencourt, advogado do
tenente-coronel, afirmou que Cid confessaria ter vendido as joias a mando de
Bolsonaro, mas apresentou um vaivém de versões em seguida, até a proposta de
delação. Segundo a revista Veja, Cid teria dito em delação que entregou o
dinheiro obtido da venda de dois relógios a Bolsonaro em mãos.
Em entrevista, Bolsonaro já chegou a dizer
que Cid tinha "autonomia" como seu ajudante de ordens e que não
mandou ninguém vender nada nem recebeu nada.
Para ficar configurado o crime de peculato é
preciso que os presentes vendidos sejam entendidos como bens públicos, o que a
defesa de Bolsonaro contesta.
GOLPISMO
No inquérito das milícias digitais, ao
descrever o que seriam os eixos de atuação da suposta organização criminosa
investigada, Moraes cita os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado
democrático de Direito e também o de tentativa de golpe de Estado.
De acordo com relatório da PF divulgado em
2023, foram encontrados nos celulares de Mauro Cid uma minuta de um decreto de
estado de sítio, além de uma espécie de estudo para a viabilidade para a
intervenção das Forças Armadas para reverter o resultado das eleições de 2022.
À época, a defesa de Bolsonaro afirmou em
nota que os diálogos encontrados reforçavam que o ex-presidente não participou
de articulações golpistas e que o celular do ex-assessor havia se tornado uma
"simples caixa de correspondência" para as "mais diversas
lamentações".
Em sua delação premiada, Mauro Cid,
ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, citou uma minuta que teria sido entregue
pelo ex-assessor Filipe Martins para convocar novas eleições e prender
adversários.
A decisão de Moraes, nesta quinta-feira (8)
afirma que o ex-presidente teve acesso e pediu modificações na chamada
"minuta do golpe", mantendo a previsão de prisão de Moraes.