Pousos e
decolagens tiveram de ser suspensos por cerca de 30 minutos na noite do último
21 de novembro em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, porque
quatro drones sobrevoavam ao mesmo tempo as proximidades do maior aeroporto do
país.
Esse transtorno a passageiros e companhias
aéreas, adotado como medida de segurança, passou a ser mais frequente. Segundo
o Decea (Departamento de Controle do Espaço Aéreo), no ano passado foram
reportados 59 casos de drones próximos de aeródromos, áreas destinadas a
pousos, decolagens e movimentação de aeronaves --os aeroportos são aeródromos
públicos.
O número é quase o dobro --84%- que o
registrado durante 2022, quando 32 ocorrências acabaram reportadas ao órgão
militar.
Os avisos são feitos por pilotos de aviões,
agentes de aeroportos e operadores de voo, entre outros.
Uma regulamentação proíbe drones e outras
aeronaves não tripuladas de voarem no espaço aéreo próximo de aeródromos --para
isso é preciso de uma autorização especial da FAB (Força Aérea Brasileira).
De acordo com instrução do Comando da
Aeronáutica, para voos de até 131 pés (aproximadamente 40 metros), a operação
de drones deve ocorrer a ao menos três milhas náuticas de distância do
aeródromo (cerca de 5,4 km).
Voos entre 131 e 400 pés (40 a 120 metros)
não podem ocorrer a menos de 5 milhas náuticas de distância (cerca de 9 km).
A preocupação com o crescimento do problema
fez o Decea emitir um alerta para pilotos terem cuidados especiais durante as
festas de fim de ano, período considerado propício para fotos, inclusive com
drones.
Gerente de navegação aérea do aeroporto em
Guarulhos, Marilisa Mira Ramos afirma que o choque entre um drone e um avião
pode provocar uma tragédia.
"Há o risco de acontecer o pior, como a
queda, porque ele [drone] pode ser sugado pela turbina e provocar uma pane. Ele
também pode bater no para-brisa [e quebrar] da aeronave", diz.
Para Cyro Albuquerque, professor de
engenharia mecânica da FEI (Fundação Educacional Inaciana), é difícil mensurar
o impacto, já que ele depende de fatores como velocidade e estrutura da
aeronave, local da colisão, massa e configuração do drone. "Mas, em um
avião de pequeno porte, provavelmente a colisão resultará em um acidente
sério", diz o engenheiro.
"Aviões de maior porte podem resistir
ao choque de pequenos objetos, dependendo do local da colisão, que pode ser
séria se ocorrer em locais como o motor, superfícies de controle ou tanques de
combustível, ou ainda causar descompressão da cabine se atingir a fuselagem."
O fechamento do espaço aéreo em novembro não
é inédito em Cumbica. A GRU Airport, concessionária que administra o aeroporto,
acionou seis vezes em 2023 os protocolos de segurança para casos de drones. Os
procedimentos incluem desde varredura no entorno até chamar a polícia.
Em Congonhas, na zona sul de São Paulo,
nenhum avião teve pouso autorizado das 13h15 às 13h31 do último dia 10 de
novembro, pelo mesmo problema --em fevereiro de 2022, todas as operações já
haviam sido suspensas por cerca de 1h20.
No dia 30 de novembro passado, um piloto da
Azul chamou a torre de controle de Viracopos para avisar que havia passado por
cima de um drone quando fazia a aproximação. A informação, que surpreendeu o
controlador de voo, foi mostrada ao vivo pelo canal Golf Oscar Romeo, que têm
câmeras para registrar pousos e decolagens em tempo real no aeroporto de
Campinas.
Henrique Hacklaender, piloto de aviação
comercial e presidente do SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas), alerta que a
presença de drones ocorre nos momentos mais críticos de uma operação de voo, em
áreas de aproximação para pouso "perto do chão" ou na decolagem
"quando o avião está cheio de combustível".
"O fechamento de um aeroporto não é
exagero, porque, além da segurança, é uma forma de se mandar um recado para as
pessoas se conscientizarem do perigo", diz.
A localização das aeronaves não tripuladas
costuma depender apenas do visual, já que o drone em geral não tem transponder,
instrumento que permite a identificação em radares.
Guarulhos e outros aeroportos chegaram a
testar uma tecnologia que alertava sobre a presença de drones, mas ela não está
mais em uso. Questionada sobre a descontinuidade do dispositivo, a
concessionária que faz a gestão do aeroporto de Guarulhos não respondeu.
A ABR (Aeroportos Brasil), associação que
representa 59 aeroportos sob concessão, diz, sem especificar quais, que todos
adotam procedimentos definidos pelos órgãos reguladores da aviação para que,
mesmo com uma natural expansão do uso de drones, os aeródromos permaneçam
seguros.
A Aeroportos Brasil, que administra
Viracopos, avalia algumas opções de dispositivos tecnológicos para detectar
drones, mas, por enquanto, além de olhares atentos, tem câmeras instaladas nas
cabeceiras da pista.
Sobre esses mecanismos, o Decea diz estar
desenvolvendo uma solução antidrones para que operadores possam se basear ao
adquirirem sistemas.
Conforme a Aeronáutica, em 2023 fora
solicitados aproximadamente 346 mil voos de drones no país.
CAMPANHAS
A popularização dos drones --com pouco mais
de R$ 100 compra-se um aparelho pela internet ou em lojas de eletrônicos--
dificulta a fiscalização, diz o presidente do Sindicato dos Aeronautas.
"Os usuários precisam entender que
drones são uma aeronave e por isso, são normatizados por regras que devem ser
cumpridas", afirma a gerente da torre de Guarulhos, Marilisa Ramos.
O advogado Vitor Barbosa, presidente da
Comissão Especial de Direito Aeronáutico da OAB-SP (Ordem dos Advogados do
Brasil em São Paulo), afirma que a legislação prevê até cinco anos de prisão
para "quem expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou
praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima,
fluvial ou aérea".
Especialistas ouvidos pela reportagem
defendem a necessidade de constantes campanhas de conscientização em bairros
próximos de aeroportos sobre os riscos de se operar drones nas imediações. Em
Guarulhos, o trabalho foi levado para cinco escolas.
"Fazemos campanhas de conscientização
não apenas do uso inseguro dos drones, mas também para os riscos de se soltar
balões e pipas", afirma Fábio Carvalho, CEO da ABR.